Sexta-feira, 21 de Maio de 2010
O Parque da Sustentabilidade (PdS) é um investimento de 14 milhões de euros, aprovado no âmbito das Parcerias para a Regeneração Urbana (PO Centro), constituído por um conjunto de projectos cujo objectivo é 'afirmar a cidade de Aveiro como um espaço de inovação, de competitividade, criando um espaço com renovado interesse para os munícipes e visitantes'. Trata-se, assim, de uma iniciativa de objectivos ambiciosos e consumidor de importantes recursos financeiros do município.
Os conceitos que defende são generosos e pertinentes ('parque' como percurso ou 'continuum' verde que organiza um conjunto de 'peças' que têm a 'sustentabilidade' como conceito âncora) e a sua localização é oportuna, já que procura estabelecer uma charneira entre um conjunto de grandes equipamentos (Hospital e Universidade), os diferentes bairros e unidades funcionais do centro da cidade e a Ria.
As recentes orientações europeias e nacionais (QREN) indicam que este tipo de 'projectos estratégicos' e o investimento que consagram, mais do que uma forma de financiar a transformação e qualificação da cidade, são uma oportunidade para afirmar uma nova agenda de preocupações (a 'sustentabilidade') e para encontrar meios para mobilizar os agentes e a comunidade para a sua partilha e implementação (mudando comportamentos e práticas). Esta preocupação é tanto mais importante quanto a cidade necessita de encontrar novas oportunidades para animar a sua base económica local, para valorizar os seus recursos endógenos (dos patrimoniais aos científico-tecnológicos) e para estimular a vida social no espaço público.
Isto significa que o método de elaboração e 'comunicação' do PdS (conceito, conteúdo e processo) deve garantir que essa 'nova agenda' é percebida, aceite e incorporada nas práticas dos diferentes 'utilizadores da cidade', assegurando, ao mesmo tempo, que o seu processo de elaboração é uma oportunidade de aprendizagem colectiva de como se deve pensar e concretizar um novo desígnio para o futuro da urbe.
Acontece que, da explicitação inicial do conceito (candidatura aprovada e apresentação pública) até ao momento, o PdS foi tomando forma sem que, para tal, os cidadãos e a comunidade tivessem sido adequadamente informados e envolvidos. Recorda-se que os projectos que constituem o PdS estiveram expostos em Janeiro deste ano, aquando da apresentação da solução da Ponte Pedonal, mas isso não configurou qualquer explicação ou debate sobre as soluções projectuais, que entretanto foram sendo desenvolvidas.
É natural, por isso, que exista alguma sensação de frustração pelos desvios entre a bondade e a ambição do conceito/programa e a natureza das propostas concretas, sobretudo naqueles que acompanham estas matérias e que tinham expectativas sobre os elevados méritos da iniciativa.
A reflexão que diversos movimentos cívicos da cidade ('Plataforma Cidades' e 'Amigosd'Avenida') entenderam lançar sobre esta matéria é, assim, um sinal de atenção e preocupação pela forma como o processo está a ser conduzido e pelas soluções técnicas encontradas.
Não estando disponível informação detalhada sobre cada um dos projectos do Parque existem algumas questões de natureza geral (decorrentes da leitura do Plano Director do Parque) que devem merecer ponderação (em sede de concepção ou de implementação da iniciativa).
A primeira, é a necessidade de integrar o PdS numa visão global para a cidade. As oportunidades e as limitações de um processo de candidatura condicionam a forma como se concebem os projectos. Contudo, é importante que se assegure uma adequada articulação do projecto com uma visão global para a cidade, em particular com três intervenções de planeamento: a nova entrada Poente da cidade (consagrada no PU da Polis), a rede de Corredores Verdes da cidade e o eixo Avenida Lourenço Peixinho/Rossio.
A segunda, é a oportunidade de definir e clarificar o perfil das ligações transversais do PdS (ligação ao Bairro Gulbenkian, UA, Hospital e Liceus), seja de carácter pedonal ou ciclável, que serão o garante de uma adequada e facilitada fruição do Parque.
A terceira, é a definição da natureza e conteúdo da 'animação' dos diferentes espaços do Parque, assegurando que o projecto 'convoca' os diversos agentes culturais e artísticos da cidade para animar e dar vida ao espaço público e mobiliza a comunidade para 'aprender' a fruir os espaços verdes (estimulando novos hábitos de lazer e cultura).
A quarta e última, é a incorporação do Rossio no Parque da Sustentabilidade. Todos reconhecem que se trata de um espaço verde central da cidade e que justifica uma urgente requalificação, pelo que não se percebe que não seja contemplado no projecto, seja através de uma eventual proposta de renegociação do financiamento, seja em detrimento da Ponte Pedonal.
Uma última nota para referir que é fundamental que a autarquia inicie, tão rápido quanto possível, o processo de discussão pública sobre os diversos projectos que constituem o PdS, para que todos possamos perceber as razões e os critérios adoptados e apresentar as suas sugestões e propostas. Se isso não acontecer como podemos esperar que os cidadãos e os diversos agentes sociais e culturais da cidade percebam os desafios, se preparem para eles e mobilizem as suas energias.
José Carlos Mota
Docente e investigador da Universidade de Aveiro