Com a devida autorização da autora, publico artigo de Teresa Castro 'O ALBOI DE ONTEM e o Alboi de hoje' que saiu esta semana nas Cartas ao Director do Diário de Aveiro.
JCM
«Há diversas teorias acerca do histórico bairro do Alboi, tanto quanto aos seus primeiros habitantes, como quanto à sua toponímia.
Numa tentativa de compreender melhor o local onde resido e, até, talvez, encontrar as razões que levam a Câmara de Aveiro a deferir um golpe mortal, à imagem do bairro e a toda a sua dinâmica, tenho vindo a fazer algumas leituras.
Quando, após pesquisa, encontrei um excerto sobre o Alboi, escrito por João Pereira de Lemos no livro Os Gafos da Ilha de Sama (uma edição da CMA), fiquei impressionada.
Passo a citar:
“Junto à Ribeira há o Alboi, aglomerado onde habitam famílias inglesas, irlandesas, holandesas e de outras nacionalidades que são quase na sua totalidade mercadores e marinheiros. É frequente as naus trazerem na tripulação mareantes das mais diversas nacionalidades que, encantados pela Vila, pelo ambiente aparentemente próspero e pelo clima, fugiram e se fixam na zona da Ribeira. É uma aljamia constante, e só se entendem por gestos. No trapiche em madeira, desde a Rua das Barcas até ao Esteiro do Paraíso ou da Promaceira, atracam as barcaças da trasfega das naus carregadas de bacalhau, ferro, aduelas, esparto, linho, alcatrão, breu, vidro e pólvora. Paus de carga são manobrados com mestria. Armazéns acolhem as cargas. Envolvem o aglomerado das casas estendais para secar o bacalhau. O Alboi, devido à composição dos seus habitantes, tem um comportamento diferente do da Vila. Há casas de tavolagem, tavernas, casas de mulheres devassas, e as ruas são alvorotadas pelas rixas nocturnas de mareantes ébrios e barulhentos.”
É que graças a este texto, agora, percebi!
É que realmente existe um paralelismo, quase profético!
Há séculos atrás, o Alboi, foi um bairro que atraíu mercadores e marinheiros . Hoje quando o Projeto do Parque da (In)sustentabilidade ficar pronto, os“mercadores e marinheiros” vão ser atraídos para fora do bairro.
Há séculos atrás existia um caminho tosco de madeira entre a rua José Rabumba e o cais do Paraíso. Hoje vão surgir esplanadas de madeira ao longo do cais do Alboi.
Há séculos atrás as barcas atracavam nos cais existentes. Hoje os residentes estacionam as suas viaturas na zona pedonal, devido à diminuição drástica de lugares de estacionamento, e as estradas estreitíssimas complicam a fruição do trânsito quando veículos efetuam cargas ou descargas.
Há séculos atrás, o bairro era uma confusão de línguas, em que os moradores só se entendiam por gestos. Hoje os moradores gesticulam contra o que se está a fazer ao bairro.
Há séculos atrás as movimentações de cargas eram feitas sem problemas. Hoje quem quiser carregar as suas mercadorias, ou somente passar, através da escada que liga o Alboi à Gulbenkian, vai ter, novamente, que usar paus de carga.
Há séculos atrás atracavam as barcas que transportavam os produtos das naus. Hoje vão estacionar autocarros na, agora atrofiada, rua Magalhães Serrão.
Há séculos atrás existiam armazéns para guardar mercadorias. Hoje construíu-se, na baixa de Sto António, um armazém como apoio aos campos de ténis.
Há séculos atrás os seus habitantes, tinham um comportamento muito característico. Hoje, têm um comportamento insubmisso e continuam a resistir contra obras que nunca quiseram.
Há séculos atrás havia casas de jogo, tavernas, prostituição e o sossego era comprometido pelas confusões noturnas de gente embriagada. Hoje continuam a existir distúrbios no Alboi, que, com toda a certeza, se vão extremar graças ao previsto corredor entre os locais de diversão noturna, com direito a passagem por baixo da Dubadoura.
Será que a História se vai repetir?»
Teresa Castro
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